sábado, 30 de abril de 2011

Cecília Meireles


"Minhas palavras são a metade de um diálogo
obscuro continuando através de séculos impossíveis.
Agora compreendo o sentido e a ressonância
que também trazes de tão longe em tua voz.
Nossas perguntas e respostas se reconhecem.
Como os olhos dentro dos espelhos.
Olhos que choraram.
Conversamos dos dois extremos da noite,
como de praias opostas.
Mas com uma voz que não se importa…
E um mar de estrelas se balança entre o meu pensamento e o teu.
Mas um mar sem viagens."

Cecília Meireles

terça-feira, 26 de abril de 2011

domingo, 24 de abril de 2011

Adélia Prado

"...quero ouvir tua alma
a que mora na garganta
como em túmulos
esperando a hora da ressurreição,
fala meu nome
antes que eu retorne
ao dia pleno,
à semi-escuridão."


Adélia Prado

terça-feira, 19 de abril de 2011

Saudade - Mia Couto


Saudade

Magoa-me a saudade
do sobressalto dos corpos
ferindo-se de ternura
sói-me a distante lembrança
do teu vestido
caindo aos nossos pés

Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas

Seja eu de novo a tua sombra, teu desejo,
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
eu
que longe de ti sou fraco
eu
que já fui água, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz exposta

Traz
de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono

Mia Couto

sábado, 16 de abril de 2011

Pitangas - Betty Vidigal

Pitangas

Era uma febre, um delírio,
Uma mandinga bem feita,
cama com cheiro de lírio.

Era um delírio, uma febre,
amor que não se endireita,
quebranto que ninguém quebra,
tremedeira de maleita,

uma mulher e um ébrio
de amor que não toma jeito.
E ela, que não se emenda?

Meus dedos fazendo renda
com os pêlos do seu peito;
o coração que se escuta
pelo quarteirão inteiro;
pitangas no travesseiro,
cama com cheiro de fruta.

Betty Vidigal

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Abril desbotado - Mara Senna


Abril desbotado

Abril surpreendeu-me em cinza,
desbotado.
Nada de cores.
Nem as flores da paineira,
nada tinha matiz.
E eu,
que amava tanto os seus tons,
que era feliz
e cantava preparando a flor de maio,
amargamente chorei.

Mara Senna
(abril/2010)

O beijo


Eu devo ter ainda guardado
o brilho nos olhos
de um beijo roubado.

Mara Senna

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Partida - Mara Senna

Partida

Naquele dia,
eu te dei as costas com a naturalidade
de quem partia por pura vontade.
Se olhasse para trás,
teria sido fatal.
Nunca fui a mulher de Lot
pra virar estátua de sal.

Mara Senna
in: Luas Novas e Antigas

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Tiros - Mara Senna

 Tiros
Em  homenagem às crianças mortas e feridas do Rio e suas famílias

Eu vejo pela tevê
e sinto a dor dos que sofrem.
Dói em minha carne
porque sou semelhante.
E também rangem meus dentes
porque sou igual.
Os tiros ainda soam nos ouvidos
das crianças que sobreviveram.
Os tiros vão soar para sempre
nos ouvidos dos pais que as perderam.
Um tiro atravessou o futuro,
ergueu um muro de lamentações.
Não me perguntem o porquê.
Eu também não sei a explicação.
Um tiro atravessou o mundo
e o feriu de morte.


Mara Senna

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Guimarães Rosa

"Deus nos dá pessoas e coisas,
para aprendermos a alegria...
Depois, retoma coisas e pessoas
para ver se já somos capazes da alegria
sozinhos...
Essa... a alegria que ele quer."

João Guimarães Rosa

terça-feira, 5 de abril de 2011