sábado, 23 de março de 2013

Penitência

Foto: Para refletirmos:

Penitência

Parou de comer doces durante a Quaresma,
mas continuou a pronunciar palavras amargas
e ásperas.
Não parou de caluniar a vida dos outros,
o seu mais cotidiano oficio,
sem se lembrar de que mais vale a misericórdia
do que o maior dos sacrifícios.
(A língua é fogo!!!)

Mara Senna

Penitência
 
Parou de comer doces durante a Quaresma,
mas continuou a pronunciar palavras amargas
e ásperas.
Não parou de caluniar a vida dos outros,
o seu mais cotidiano oficio,
sem se lembrar de que mais vale a misericórdia
do que o maior dos sacrifícios.
(A língua é fogo!!!)

Mara Senna
 
 

sexta-feira, 22 de março de 2013

Canção de Outono - Mário Quintana

 
Foto: CANÇÃO DE OUTONO

O outono toca realejo
No pátio da minha vida.
Velha canção, sempre a mesma,
Sob a vidraça descida...

Tristeza? Encanto? Desejo?
Como é possível sabê-lo?
Um gozo incerto e dorido
De carícia a contrapelo...

Partir, ó alma, que dizes?
Colher as horas, em suma...
Mas os caminhos do Outono
Vão dar em parte nenhuma!

Mario Quintana in: Canções – 1946
 
Canção de Outono
 
O outono toca realejo
No pátio da minha vida.
Velha canção, sempre a mesma,
Sob a vidraça descida...
 
Tristeza? Encanto? Desejo?
Como é possível sabê-lo?
Um gozo incerto e dorido
De carícia a contrapelo...

Partir, ó alma, que dizes?
Colher as horas, em suma...
Mas os caminhos do Outono
Vão dar em parte nenhuma!

Mario Quintana
in: Canções – 1946

segunda-feira, 18 de março de 2013

Trombetas

 
 
No domingo à noite,
as pessoas que acordaram tarde
ficam tão insones,
que os anjos da guarda,
de tão cansados,
dormem antes,
para poder tocar pontualmente as trombetas
na segunda-feira.
(mesmo que ninguém queira...)

Mara Senna
Imagem: Felix-Mas

quarta-feira, 13 de março de 2013

Participação em Blocos Online

 Mais dois poemas meus na chamada de capa de Blocos Online da escritora Leila Míccolis. O tema agora é saudade. Confiram:
http://www.blocosonline.com.br/home/index.php

Mia Couto


Foto: O amor nos condena:
 demoras
 mesmo quando chegas antes.
Porque não é no tempo que eu te espero. 
Espero-te antes de haver vida
e és tu quem faz nascer os dias. 
MIA COUTO
 
Do poema "A Demora", no livro
 "Idades cidades divindades"
Imagem: Will Barnet
 
O amor nos condena:
demoras
mesmo quando chegas antes.
Porque não é no tempo que eu te espero.
Espero-te antes de haver vida
e és tu quem faz nascer os dias.


Mia Couto

Do poema "A Demora", no livro
"Idades cidades divindades"
 
Imagem: Will Barnet


segunda-feira, 11 de março de 2013

Poema menos triste


Foto: Poema menos triste

Haverá reencontros tantos
quanto são as estrelas no firmamento.
A palavra saudade não existe 
no vocabulário do céu.

Mara Senna
 
Poema menos triste
 
Haverá reencontros tantos
quanto são as estrelas no firmamento.
A palavra saudade não existe
no vocabulário do céu.

Mara Senna


domingo, 10 de março de 2013

Poema Triste


Foto: Poema triste

O não ter filhos
não me poupou de sentir a dor
dos que os perdem.
É preciso muito consolo
para aceitar esta mudança de colo,
este aparente  equívoco 
nos tempos de partida,
essa contranatureza,
refluxo de correnteza.
Mistérios imcompreensíveis 
aos nossos olhos humanos e fracos.
Os braços que perdem os filhos
precisam dos abraços de Deus.

Mara Senna 
Para a Cármen Lucia Soares, com o meu carinho.
 
Poema triste

O não ter filhos
não me poupou de sentir a dor
dos que os perdem.
É preciso muito consolo

para aceitar esta mudança de colo,
este aparente equívoco
nos tempos de partida,
essa contranatureza,
refluxo de correnteza.
Mistérios incompreensíveis
aos nossos olhos humanos e fracos.
Os braços que perdem os filhos
precisam dos abraços de Deus.

Mara Senna

 

sexta-feira, 8 de março de 2013

Mulheres



Foto: Mulheres

Somos divas cheias de dádivas,
da esperança, sempre grávidas
e temos mais fé do que dúvidas.
Corajosas e intuitivas,
nos atiramos ávidas
sem nos importar
com as coisas havidas:
somos sempre pela vida, vida, VIDA!

Mara Senna 

Foto: Françoise Felix
Ilustração: Françoise Felix
 
Mulheres

Somos divas cheias de dádivas,
da esperança, sempre grávidas
e temos mais fé do que dúvidas.
Corajosas e intuitivas,
 nos atiramos ávidas
sem nos importar
com as coisas havidas:
somos sempre pela vida, vida, VIDA!

Mara Senna
 

segunda-feira, 4 de março de 2013

O amor acaba - Paulo Mendes Campos


O amor acaba. Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar; de repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas; na acidez da aurora tropical, depois duma noite votada à alegria póstuma, que não veio; e acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como tentáculos saciados, e elas se movimentam no escuro como dois polvos de solidão; como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado; na insônia dos braços luminosos do relógio; e acaba o amor nas sorveterias diante do colorido iceberg, entre frisos de alumínio e espelhos monótonos; e no olhar do cavaleiro errante que passou pela pensão; às vezes acaba o amor nos braços torturados de Jesus, filho crucificado de todas as mulheres; mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia; no andar diferente da irmã dentro de casa o amor pode acabar; na epifania da pretensão ridícula dos bigodes; nas ligas, nas cintas, nos brincos e nas silabadas femininas; quando a alma se habitua às províncias empoeiradas da Ásia, onde o amor pode ser outra coisa, o amor pode acabar; na compulsão da simplicidade simplesmente; no sábado, depois de três goles mornos de gim à beira da piscina; no filho tantas vezes semeado, às vezes vingado por alguns dias, mas que não floresceu, abrindo parágrafos de ódio inexplicável entre o pólen e o gineceu de duas flores; em apartamentos refrigerados, atapetados, aturdidos de delicadezas, onde há mais encanto que desejo; e o amor acaba na poeira que vertem os crepúsculos, caindo imperceptível no beijo de ir e vir; em salas esmaltadas com sangue, suor e desespero; nos roteiros do tédio para o tédio, na barca, no trem, no ônibus, ida e volta de nada para nada; em cavernas de sala e quarto conjugados o amor se eriça e acaba; no inferno o amor não começa; na usura o amor se dissolve; em Brasília o amor pode virar pó; no Rio, frivolidade; em Belo Horizonte, remorso; em São Paulo, dinheiro; uma carta que chegou depois, o amor acaba; uma carta que chegou antes, e o amor acaba; na descontrolada fantasia da libido; às vezes acaba na mesma música que começou, com o mesmo drinque, diante dos mesmos cisnes; e muitas vezes acaba em ouro e diamante, dispersado entre astros; e acaba nas encruzilhadas de Paris, Londres, Nova Iorque; no coração que se dilata e quebra, e o médico sentencia imprestável para o amor; e acaba no longo périplo, tocando em todos os portos, até se desfazer em mares gelados; e acaba depois que se viu a bruma que veste o mundo; na janela que se abre, na janela que se fecha; às vezes não acaba e é simplesmente esquecido como um espelho de bolsa, que continua reverberando sem razão até que alguém, humilde, o carregue consigo; às vezes o amor acaba como se fora melhor nunca ter existido; mas pode acabar com doçura e esperança; uma palavra, muda ou articulada, e acaba o amor; na verdade; o álcool; de manhã, de tarde, de noite; na floração excessiva da primavera; no abuso do verão; na dissonância do outono; no conforto do inverno; em todos os lugares o amor acaba; a qualquer hora o amor acaba; por qualquer motivo o amor acaba; para recomeçar em todos os lugares e a qualquer minuto o amor acaba.
 
Paulo Mendes Campos

 
Texto extraído do livro "O amor acaba", Editora Civilização Brasileira – Rio de Janeiro, 1999, pág. 21, organização e apresentação de Flávio Pinheiro.