Bem-vindo(a) ao meu blog! Sou Mara Senna. A poesia é o meu ofício, minha virtude e o meu vício, meu fim e meu início.Meu recomeço. Um desejo que não me larga, um amor que eu não esqueço. Uma dor comprida, uma alegria vivida, uma saudade sentida, uma palavra sufocada. A poesia em mim é tudo ou nada.
quinta-feira, 30 de julho de 2009
Ziraldo - FLICTS
"Não tinha a força do Vermelho,não tinha a imensidão do Amarelo,nem a paz que tem o Azul.
Era apenas o frágil e feio e aflito Flicts"
Era apenas o frágil e feio e aflito Flicts"
Quem esteve ontem em Ribeirão Preto, participando de um salão de ideias,
foi o formidável Ziraldo, adorável figura, pai de tantos personagens,
sendo o mais famoso o Menino Maluquinho.
O primeiro livro de Ziraldo, FLICTS, está completando 40 anos de vida.
Editado pela primeira vez em 1969, conta a história de uma cor procurando o seu lugar no mundo, até que descobre que a lua dos astronautas é flicts.
Editado pela primeira vez em 1969, conta a história de uma cor procurando o seu lugar no mundo, até que descobre que a lua dos astronautas é flicts.
O livro foi traduzido para diversos idiomas.
Ziraldo será o escritor infanto-juvenil homenageado da 10. Feira do Livro de Ribeirão Preto em 2010, homenagem mais do que merecida.
Ziraldo será o escritor infanto-juvenil homenageado da 10. Feira do Livro de Ribeirão Preto em 2010, homenagem mais do que merecida.
segunda-feira, 27 de julho de 2009
Metáfora
Dia desses lembrei -me desta música com a qual os poetas vão se identificar:
Metáfora
Composição: Gilberto Gil - 1982
Uma lata existe para conter algo
Mas quando o poeta diz:
"Lata"
Pode estar querendo dizer o incontível
Uma meta existe para ser um alvo
Mas quando o poeta diz:
"Meta"
Pode estar querendo dizer o inatingível
Por isso, não se meta a exigir do poeta
Que determine o conteúdo em sua lata
Na lata do poeta tudo nada cabe
Pois ao poeta cabe fazer
Com que na lata venha caber
O incabível
Deixe a meta do poeta, não discuta
Deixe a sua meta fora da disputa
Meta dentro e fora, lata absoluta
Deixe-a simplesmente
metáfora
segunda-feira, 20 de julho de 2009
Amigos
Benditos!!!
*Machado de Assis*
Benditos os que possuem amigos,
os que os têm sem pedir,
Porque amigos não se pede,
não se compra nem se vende.
Amigo a gente sente!
Benditos os que sofrem por amigos,
os que falam com o olhar,
Porque amigo não se cala
não questiona nem se rende,
Amigo a gente entende!
Benditos os que guardam amigos,
os que entregam o ombro pra chorar,
Porque amigo sofre e chora.
Amigo não tem hora
pra consolar!
Benditos sejam os amigos
que acreditam na tua verdade,
ou te apontam a realidade,
Porque amigo é a direção
é a base, quando falta o chão!
Benditos sejam todos os amigos
de raízes, verdadeiros,
Porque amigos são herdeiros
da real sagacidade.
Ter amigos é a melhor cumplicidade!
Benditos os que possuem amigos,
os que os têm sem pedir,
Porque amigos não se pede,
não se compra nem se vende.
Amigo a gente sente!
Benditos os que sofrem por amigos,
os que falam com o olhar,
Porque amigo não se cala
não questiona nem se rende,
Amigo a gente entende!
Benditos os que guardam amigos,
os que entregam o ombro pra chorar,
Porque amigo sofre e chora.
Amigo não tem hora
pra consolar!
Benditos sejam os amigos
que acreditam na tua verdade,
ou te apontam a realidade,
Porque amigo é a direção
é a base, quando falta o chão!
Benditos sejam todos os amigos
de raízes, verdadeiros,
Porque amigos são herdeiros
da real sagacidade.
Ter amigos é a melhor cumplicidade!
domingo, 19 de julho de 2009
sexta-feira, 17 de julho de 2009
quinta-feira, 16 de julho de 2009
Pequenas Epiifanias
foto: Clark Little
Caio Fernando Abreu
Por trás do que acontecia, eu redescobria magias sem susto algum. E de repente me sentia protegido, você sabe como: a vida toda, esses pedacinhos desconexos, se armavam de outro jeito, fazendo sentido. Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Libra. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas. Nunca mais sair do centro daquele espaço para as duras ruas anônimas. Nunca mais sair daquele colo quente que é ter uma face para outra pessoa que também tem uma face para você, no meio da tralha desimportante e sem rosto de cada dia atravancando o coração.
Mas no quarto, quinto dia, um trecho obsessivo do conto de Clarice Lispector "Tentação" na cabeça estonteada de encanto: "Mas ambos estavam comprometidos. Ele, com sua natureza aprisionada. Ela, com sua infância impossível". Cito de memória, não sei se correto. Fala no encontro de uma menina ruiva, sentada num degrau às três da tarde, com um cão basset também ruivo, que passa acorrentado. Ele pára. Os dois se olham. Cintilam, prometidos. A dona o puxa. Ele se vai. E nada acontece.
De mais a mais, eu não queria. Seria preciso forjar climas, insinuar convites, servir vinhos, acender velas, fazer caras. Para talvez ouvir não. A não ser que soprasse tanto vento que velejasse por si. Não velejou. Além disso, sem perceber, eu estava dentro da aprendizagem solitária do não-pedir. Só compreendi dias depois, quando um amigo me falou — descuidado, também — em pequenas epifanias. Miudinhas, quase pífias revelações de Deus feito jóias encravadas no dia-a-dia. Era isso - aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha opaca vida com os mesmos olhos atentos com que eu a olhava: uma pequena epifania.
Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos. Recuperei um jeito de fumar olhando para trás das janelas, vendo o que ninguém veria. Atrás das janelas, retomo esse momento de mel e sangue que Deus colocou tão rápido, e com tanta delicadeza, frente aos meus olhos há tanto tempo incapazes de ver: uma possibilidade de amor. Curvo a cabeça, agradecido. E se estendo a mão, no meio da poeira de dentro de mim, posso tocar também em outra coisa. Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então. E quase paro de sentir fome.
(Publicado no jornal "O Estado de S. Paulo", 22/04/1986) PEQUENAS EPIFANIAS
Fragmentos disso que chamamos de "minha vida".
Caio Fernando Abreu
Há alguns dias, Deus — ou isso que chamamos assim, tão descuidadamente, de Deus —, enviou-me certo presente ambíguo: uma possibilidade de amor. Ou disso que chamamos, também com descuido e alguma pressa, de amor.
E você sabe a que me refiro. Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer — eu já estava lá dentro. E estar dentro daquilo era bom. Não me entenda mal — não aconteceu qualquer intimidade dessas que você certamente imagina. Na verdade, não aconteceu quase nada. Dois ou três almoços, uns silêncios. Fragmentos disso que chamamos, com aquele mesmo descuido, de "minha vida". Outros fragmentos, daquela "outra vida". De repente cruzadas ali, por puro mistério, sobre as toalhas brancas e os copos de vinho ou água, entre casquinhas de pão e cinzeiros cheios que os garçons rapidamente esvaziavam para que nos sentíssemos limpos. E nos sentíamos.Por trás do que acontecia, eu redescobria magias sem susto algum. E de repente me sentia protegido, você sabe como: a vida toda, esses pedacinhos desconexos, se armavam de outro jeito, fazendo sentido. Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Libra. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas. Nunca mais sair do centro daquele espaço para as duras ruas anônimas. Nunca mais sair daquele colo quente que é ter uma face para outra pessoa que também tem uma face para você, no meio da tralha desimportante e sem rosto de cada dia atravancando o coração.
Mas no quarto, quinto dia, um trecho obsessivo do conto de Clarice Lispector "Tentação" na cabeça estonteada de encanto: "Mas ambos estavam comprometidos. Ele, com sua natureza aprisionada. Ela, com sua infância impossível". Cito de memória, não sei se correto. Fala no encontro de uma menina ruiva, sentada num degrau às três da tarde, com um cão basset também ruivo, que passa acorrentado. Ele pára. Os dois se olham. Cintilam, prometidos. A dona o puxa. Ele se vai. E nada acontece.
De mais a mais, eu não queria. Seria preciso forjar climas, insinuar convites, servir vinhos, acender velas, fazer caras. Para talvez ouvir não. A não ser que soprasse tanto vento que velejasse por si. Não velejou. Além disso, sem perceber, eu estava dentro da aprendizagem solitária do não-pedir. Só compreendi dias depois, quando um amigo me falou — descuidado, também — em pequenas epifanias. Miudinhas, quase pífias revelações de Deus feito jóias encravadas no dia-a-dia. Era isso - aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha opaca vida com os mesmos olhos atentos com que eu a olhava: uma pequena epifania.
Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos. Recuperei um jeito de fumar olhando para trás das janelas, vendo o que ninguém veria. Atrás das janelas, retomo esse momento de mel e sangue que Deus colocou tão rápido, e com tanta delicadeza, frente aos meus olhos há tanto tempo incapazes de ver: uma possibilidade de amor. Curvo a cabeça, agradecido. E se estendo a mão, no meio da poeira de dentro de mim, posso tocar também em outra coisa. Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então. E quase paro de sentir fome.
segunda-feira, 13 de julho de 2009
Teatro - Ensina-me a viver
Ensina-me a viver
Semana passada fui assistir à peça Ensina-me A Viver, uma das mais inusitadas e emocionantes histórias de amor do século 20, baseada no filme homônimo de 1971.
Para estrelar essa segunda montagem, que em 1981 teve os atores Henriette Morineau e Diogo Vilela, entraram em cena Glória Menezes e Arlindo Lopes.
Harold é um senhor de quase vinte anos, obcecado pela morte. Maude é uma menina de quase oitenta anos, apaixonada pela vida. Sensível, inteligente e rico, Harold perdeu o pai quando ele ainda era menino. Convive com uma mãe indiferente e autoritária, numa relação desprovida de qualquer contato afetuoso. Atormentado, Harold tenta chamar a atenção materna simulando tragicômicas tentativas de suicídio. A quase octogenária Maude, ao contrário, tem uma paixão incomparável pela vida. Aproveita cada segundo de sua existência como se fosse o último. O contato entre esses dois não poderia ser mais inusitado e improvável, mas quando se encontram, a sintonia é imediata. Maude, cheia de alegria e positividade, ensina ao deslocado Harold os prazeres da vida e da liberdade.
A montagem é ótima, todos os atores são espetaculares. Arlindo Lopes arrasa como Harold. E, óbvio, Glória Menezes merece todas as honras. Fantástica!
Enfim, uma peça emocionante, que faz a gente refletir sobre como é importante viver intensamente cada momento.
Frase-chave da peça: "O coração que não desistiu jamais envelhece..."
Semana passada fui assistir à peça Ensina-me A Viver, uma das mais inusitadas e emocionantes histórias de amor do século 20, baseada no filme homônimo de 1971.
Para estrelar essa segunda montagem, que em 1981 teve os atores Henriette Morineau e Diogo Vilela, entraram em cena Glória Menezes e Arlindo Lopes.
Harold é um senhor de quase vinte anos, obcecado pela morte. Maude é uma menina de quase oitenta anos, apaixonada pela vida. Sensível, inteligente e rico, Harold perdeu o pai quando ele ainda era menino. Convive com uma mãe indiferente e autoritária, numa relação desprovida de qualquer contato afetuoso. Atormentado, Harold tenta chamar a atenção materna simulando tragicômicas tentativas de suicídio. A quase octogenária Maude, ao contrário, tem uma paixão incomparável pela vida. Aproveita cada segundo de sua existência como se fosse o último. O contato entre esses dois não poderia ser mais inusitado e improvável, mas quando se encontram, a sintonia é imediata. Maude, cheia de alegria e positividade, ensina ao deslocado Harold os prazeres da vida e da liberdade.
A montagem é ótima, todos os atores são espetaculares. Arlindo Lopes arrasa como Harold. E, óbvio, Glória Menezes merece todas as honras. Fantástica!
Enfim, uma peça emocionante, que faz a gente refletir sobre como é importante viver intensamente cada momento.
Frase-chave da peça: "O coração que não desistiu jamais envelhece..."
domingo, 12 de julho de 2009
Timidez - Cecília Meireles
Foto: Carmen Fanganiello
Timidez
Cecília Meireles
Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve...
— mas só esse eu não farei.
Uma palavra caída
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes...
— palavra que não direi.
Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos noturnos,
— que amargamente inventei.
E, enquanto não me descobres,
os mundos vão navegando
nos ares certos do tempo,
até não se sabe quando...
— e um dia me acabarei.
Timidez
Cecília Meireles
Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve...
— mas só esse eu não farei.
Uma palavra caída
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes...
— palavra que não direi.
Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos noturnos,
— que amargamente inventei.
E, enquanto não me descobres,
os mundos vão navegando
nos ares certos do tempo,
até não se sabe quando...
— e um dia me acabarei.
terça-feira, 7 de julho de 2009
segunda-feira, 6 de julho de 2009
Não Mais - Mara Senna
Não mais
Agora que não mais,
só me resta desfazer as malas,
abaixar as velas
e esperar ventos mais favoráveis.
Mas,
embora eu saiba bem
os meus motivos,
incomoda-me do mesmo jeito,
pois o querer partir,
este querer conquistado e suado,
continua vivo
e briga com o não poder
bem aqui, dentro do peito.
Mas consolo-me,
pois bem sei o que me aguardaria
em meio às tempestades.
Mas, qualquer hora o sol aparece,
crio coragem de novo,
faço as malas,
iço as velas
e parto.
O resto será o de menos.
O resto será o de menos.
(Mara Senna)
Nota da autora: dedico este poema à minha amiga Márcia , para que nunca desista da partida.
domingo, 5 de julho de 2009
FLIP - Antônio Lobo Antunes
Um português brasileiro - Blog da FLIPJulho 05, 2009
O escritor português António Lobo Antunes arrancou aplausos calorosos da plateia, no noite de sábado, em conversa com o jornalista brasileiro Humberto Werneck. Um dos maiores ficcionistas da atualidade, o autor disse estar escrevendo em Paraty, relembrou suas raízes brasileiras, falou sobre os autores de que mais gosta (especialmente os brasileiros), definiu a arte de escrever como um trabalho “impossível”. Ao comentar sua obsessão em corrigir seus textos à exaustão, decretou: “O escritor aspira à arte total”.O autor de Arquipélago da insônia e Meu nome é legião emocionou o público ao relembrar o avô, seu homônimo, que morou em Belém do Pará, a avó, para quem escrevia (e vendia) poemas religiosos, e o pai, que lia poesia brasileira, para ele e os irmãos, antes de eles dormirem. “O Brasil para mim não é um país. São cheiros, é a comida, maneiras de viver e falar. O Brasil é uma coisa íntima”.Lobo Antunes rememorou as leituras dos autores brasileiros do século XIX: Machado de Assis, José de Alencar, Raul Pompeia, Aluízio Azevedo. “Foi onde mamei”, disse ele. O escritor relembrou a relação com Jorge Amado e com João Ubaldo Ribeiro. “Era muito terno comigo, tinha uma relação filial. Me dizia: ‘Gosto de lamber meus filhotes’.” A leitura de poesia, para o escritor, ensina mais que a prosa. “Li os grandes poetas brasileiros. Seus livros estavam em casa: Drummond, Cabral, Bandeira, Murilo Mendes, Jorge de Lima”. Para escrever bem é preciso cortar até osso, advérbios, adjetivos, que Cortazar chamava de “essas p...”.Sobre a arte de escrever, disse que o livro é um organismo vivo e que todo grande livro é “uma reflexão profunda sobre a arte de escrever”. “Quando entra em você, ele se faz sozinho, deixa as mãos felizes.” Disse que é preciso ir até as camadas mais profundas de todas as superfícies superpostas da consciência. “Por isso gosto de escrever por cansaço.”E ainda deu receita para escrever, aludindo ao futebol brasileiro: é preciso cabeça, para criar, e mãos para corrigir. “A cabeça cria e a mão corrige. Para quem quer ser escritor, recomendo observar Garrincha jogando. É preciso ter a cabeça de um Didi e a habilidade de um Garrincha.” E, citando Fernando Pessoa, disse que muitas vezes o escritor recebe textos prontos: “O escritor é emissário de um rei desconhecido”.
O escritor português António Lobo Antunes arrancou aplausos calorosos da plateia, no noite de sábado, em conversa com o jornalista brasileiro Humberto Werneck. Um dos maiores ficcionistas da atualidade, o autor disse estar escrevendo em Paraty, relembrou suas raízes brasileiras, falou sobre os autores de que mais gosta (especialmente os brasileiros), definiu a arte de escrever como um trabalho “impossível”. Ao comentar sua obsessão em corrigir seus textos à exaustão, decretou: “O escritor aspira à arte total”.O autor de Arquipélago da insônia e Meu nome é legião emocionou o público ao relembrar o avô, seu homônimo, que morou em Belém do Pará, a avó, para quem escrevia (e vendia) poemas religiosos, e o pai, que lia poesia brasileira, para ele e os irmãos, antes de eles dormirem. “O Brasil para mim não é um país. São cheiros, é a comida, maneiras de viver e falar. O Brasil é uma coisa íntima”.Lobo Antunes rememorou as leituras dos autores brasileiros do século XIX: Machado de Assis, José de Alencar, Raul Pompeia, Aluízio Azevedo. “Foi onde mamei”, disse ele. O escritor relembrou a relação com Jorge Amado e com João Ubaldo Ribeiro. “Era muito terno comigo, tinha uma relação filial. Me dizia: ‘Gosto de lamber meus filhotes’.” A leitura de poesia, para o escritor, ensina mais que a prosa. “Li os grandes poetas brasileiros. Seus livros estavam em casa: Drummond, Cabral, Bandeira, Murilo Mendes, Jorge de Lima”. Para escrever bem é preciso cortar até osso, advérbios, adjetivos, que Cortazar chamava de “essas p...”.Sobre a arte de escrever, disse que o livro é um organismo vivo e que todo grande livro é “uma reflexão profunda sobre a arte de escrever”. “Quando entra em você, ele se faz sozinho, deixa as mãos felizes.” Disse que é preciso ir até as camadas mais profundas de todas as superfícies superpostas da consciência. “Por isso gosto de escrever por cansaço.”E ainda deu receita para escrever, aludindo ao futebol brasileiro: é preciso cabeça, para criar, e mãos para corrigir. “A cabeça cria e a mão corrige. Para quem quer ser escritor, recomendo observar Garrincha jogando. É preciso ter a cabeça de um Didi e a habilidade de um Garrincha.” E, citando Fernando Pessoa, disse que muitas vezes o escritor recebe textos prontos: “O escritor é emissário de um rei desconhecido”.
sábado, 4 de julho de 2009
FLIP- Chico Buarque e Milton Hatoum
Falcatruas brasileiras - Blog da FLIPJulho 03, 2009
Falcatruas, mamatas, narrativas míticas, literatura e música foram tema da conversa entre Chico Buarque e Milton Hatoum, na mesa 10 da FLIP 2009. Como se esperava, “Sequências brasileiras”, foi a mesa literária mais concorrida deste ano, até o momento. O blog da FLIP acompanhou a conversa de fora da Tenda do Telão, no início da noite de sexta, nas ruas lotadas de Paraty. Chico Buarque e Milton Hatoum contaram como conceberam seus relatos mais recentes: o romance Leite derramado e a novela Órfãos do Eldorado, respectivamente. O livro de Chico é narrado por Eulálio, um homem centenário que relembra os tempos de glória de sua família quatrocentona, inclusive algumas falcatruas, como a de um deputado paulista que ganhou uma “mamata”: a concessão para construir o porto de Manaus. “São histórias reais, que ouvi contar por gente conhecida minha.” O fato de ser filho do historiador Sergio Buarque pode ter ajudado na composição da história. “Papai gostava de contar muitas histórias e gostava muito de fofoca. “Reunia os amigos e contava coisas escabrosas”. O romance tem como protagonista e narrador esse membro de uma família da elite brasileira, que se denuncia no próprio relato. Milton Hatoum também foi buscar na história inspiração para sua novela. Mas a narrativa de Arminto Cordovil esbarra não só em episódios históricos, mas também no mito de Eldorado, a rica e mítica cidade perdida no fundo de um rio. Milton contou que sua pesquisa histórica, feita para compor a história, resultou em material farto a respeito das falcatruas brasileiras. Indagado se sentia um escritor regional, disse que sim, com orgulho. Sou tão regional que me torno universal. Num mundo globalizado como o de hoje, sem chão histórico, ser regional é motivo de orgulho.” Comentando algumas semelhanças sobre os dois livros, os dois escritores disseram, em tom de piada, que haviam copiado uma ao outro. Os autores comentaram ainda a concisão de suas obras, e outros escritores de que gostam, como Guimarães Rosa. Chico comentou ainda que prefere ler a escrever. “Escrever é chatíssimo”, disse ele. “Durante o tempo que eu escrevia o livro, todo dia relia o texto inteiro”. Comentou também a dificuldade de se livrar dos livros anteriores. “Os narradores permanecem na minha cabeça”. E falou também sobre a relação entre música e literatura. “Tenho necessidade de sentir musicalmente cada frase. Se o que escrevo não estiver cantável, jogo fora”.Ao final da mesa, Chico se pronunciou a favor das comunidades quilombolas, indígenas e caiçaras, que fizeram manifestação pelas ruas de Paraty nesta sexta.
Falcatruas, mamatas, narrativas míticas, literatura e música foram tema da conversa entre Chico Buarque e Milton Hatoum, na mesa 10 da FLIP 2009. Como se esperava, “Sequências brasileiras”, foi a mesa literária mais concorrida deste ano, até o momento. O blog da FLIP acompanhou a conversa de fora da Tenda do Telão, no início da noite de sexta, nas ruas lotadas de Paraty. Chico Buarque e Milton Hatoum contaram como conceberam seus relatos mais recentes: o romance Leite derramado e a novela Órfãos do Eldorado, respectivamente. O livro de Chico é narrado por Eulálio, um homem centenário que relembra os tempos de glória de sua família quatrocentona, inclusive algumas falcatruas, como a de um deputado paulista que ganhou uma “mamata”: a concessão para construir o porto de Manaus. “São histórias reais, que ouvi contar por gente conhecida minha.” O fato de ser filho do historiador Sergio Buarque pode ter ajudado na composição da história. “Papai gostava de contar muitas histórias e gostava muito de fofoca. “Reunia os amigos e contava coisas escabrosas”. O romance tem como protagonista e narrador esse membro de uma família da elite brasileira, que se denuncia no próprio relato. Milton Hatoum também foi buscar na história inspiração para sua novela. Mas a narrativa de Arminto Cordovil esbarra não só em episódios históricos, mas também no mito de Eldorado, a rica e mítica cidade perdida no fundo de um rio. Milton contou que sua pesquisa histórica, feita para compor a história, resultou em material farto a respeito das falcatruas brasileiras. Indagado se sentia um escritor regional, disse que sim, com orgulho. Sou tão regional que me torno universal. Num mundo globalizado como o de hoje, sem chão histórico, ser regional é motivo de orgulho.” Comentando algumas semelhanças sobre os dois livros, os dois escritores disseram, em tom de piada, que haviam copiado uma ao outro. Os autores comentaram ainda a concisão de suas obras, e outros escritores de que gostam, como Guimarães Rosa. Chico comentou ainda que prefere ler a escrever. “Escrever é chatíssimo”, disse ele. “Durante o tempo que eu escrevia o livro, todo dia relia o texto inteiro”. Comentou também a dificuldade de se livrar dos livros anteriores. “Os narradores permanecem na minha cabeça”. E falou também sobre a relação entre música e literatura. “Tenho necessidade de sentir musicalmente cada frase. Se o que escrevo não estiver cantável, jogo fora”.Ao final da mesa, Chico se pronunciou a favor das comunidades quilombolas, indígenas e caiçaras, que fizeram manifestação pelas ruas de Paraty nesta sexta.
sexta-feira, 3 de julho de 2009
Pasárgada - Manuel Bandeira
VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA
Manuel Bandeira
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que eu nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água.
Pra me contar histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
Lá sou amigo do rei
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que eu nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água.
Pra me contar histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
Lá sou amigo do rei
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
Nota da autora: dedico este poema ao grande artista Djalma 'Fênix' Cano, que sabe declamá-lo como ninguém.
quinta-feira, 2 de julho de 2009
7ª Festa LiteráriaInternacional de Paraty
Alumbramentos bandeirianos - Blog da FLIPJulho 01, 2009
A Conferência de Abertura da FLIP teve como tema a poesia de Manuel Bandeira. O professor e crítico Davi Arrigucci Jr. falou sobre a importância do alumbramento (epifania, êxtase, a “emoção diferente da poesia”) na obra do autor pernambucano que morou a maior parte de sua vida no Rio de Janeiro. Foi, aliás, no morro do Curvelo, em Santa Teresa, no Rio, que se deu a viravolta na vida de Bandeira, uma verdadeira guinada que fez com que sua poesia passasse a atentar para a simplicidade do cotidiano. Foi ali, no pé do morro carioca, que o autor deixou de lado o sentimento “cabotino da piedade de si mesmo”, numa “superação do sentimentalismo” que vai dar na poesia humilde, atenta ao que a vida simples tem de mais sublime. Para Arrigucci, a poesia de Bandeira é marcada pela convivência e pelo diálogo entre o alto e o baixo, o interior e o espaço de fora, entre o quarto e a rua. Bandeira deixa “o ruído do mundo humilde” penetrar nos sentimentos elevados do alumbramento. Por meio da leitura de alguns poemas do autor, como “Momento num café”, “Poema só para Jaime Ovalle”, “Comentário musical” e “Poema do beco”, Arrigucci empreendeu um verdadeiro itinerário pela Pasárgada de Bandeira: do escritor que recebeu a herança romântica do poeta que vai morrer jovem à formação do autor como um dos mais inventivos e influentes poetas modernistas brasileiros. Foi saudado de pé pelo público da FLIP 2009.
A Conferência de Abertura da FLIP teve como tema a poesia de Manuel Bandeira. O professor e crítico Davi Arrigucci Jr. falou sobre a importância do alumbramento (epifania, êxtase, a “emoção diferente da poesia”) na obra do autor pernambucano que morou a maior parte de sua vida no Rio de Janeiro. Foi, aliás, no morro do Curvelo, em Santa Teresa, no Rio, que se deu a viravolta na vida de Bandeira, uma verdadeira guinada que fez com que sua poesia passasse a atentar para a simplicidade do cotidiano. Foi ali, no pé do morro carioca, que o autor deixou de lado o sentimento “cabotino da piedade de si mesmo”, numa “superação do sentimentalismo” que vai dar na poesia humilde, atenta ao que a vida simples tem de mais sublime. Para Arrigucci, a poesia de Bandeira é marcada pela convivência e pelo diálogo entre o alto e o baixo, o interior e o espaço de fora, entre o quarto e a rua. Bandeira deixa “o ruído do mundo humilde” penetrar nos sentimentos elevados do alumbramento. Por meio da leitura de alguns poemas do autor, como “Momento num café”, “Poema só para Jaime Ovalle”, “Comentário musical” e “Poema do beco”, Arrigucci empreendeu um verdadeiro itinerário pela Pasárgada de Bandeira: do escritor que recebeu a herança romântica do poeta que vai morrer jovem à formação do autor como um dos mais inventivos e influentes poetas modernistas brasileiros. Foi saudado de pé pelo público da FLIP 2009.
quarta-feira, 1 de julho de 2009
Despedindo da Feira do Livro de Ribeirão Preto
Thiago de Mello: carisma
Zuenir: pura simpatia
Cony, meu afilhado, com meu livro
Gostaria de compartilhar com vocês algumas fotos da Feira do Livro, que foi de altíssimo nível.
Em especial, quero ressaltar as presenças do Carlos Heitor Cony, de quem eu fui madrinha e sobre quem já comentei , do Zuenir Ventura, muito simpático como sempre, e do carismático, grande poeta amazonense, Thiago de Mello.
Também tive a oportunidade de estar com a Marina Colasanti, o Marcelo Rubens Paiva, Márcio Souza, Gaitano Antonaccio, Ricardo Silvestrin. A todos eles entreguei o meu livro Luas Novas e Antigas.
Também participaram Moacyr Scliar, Fernando Morais, Martha Medeiros, Cristivão Tezza. Milton Hatoum e muitos mais. Um time e tanto. Aguardamos a próxima FLRP ansiosos.
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