segunda-feira, 31 de maio de 2010

Esperança - Roseana Murray

Esperança

Muitos são os que carregam
água na peneira,
como disse o poeta Manoel de Barros,
e esperança como estrela
na lapela.
Muitos são os que acreditam
em coisas simples e limpas,
em coisas essenciais,
amor, amizade, delicadeza,
paz,
e tantas outras palavras,
antigas e urgentes.

Roseana Murray,

é uma poetisa infanto-juvenil carioca
 Poema de Manual da Delicadeza de A a Z, ed. FTD, 2001

Amanhecer - Nuno Júdice

Amanhecer

Ouço bater o teu coração nesta manhã
em que uma luz de argila constrói o busto
do tempo, que um dia descobrirás dentro
de ti, e onde irás reconhecer um rosto
outrora amado. Mas não esperes; o dia de hoje é
o dia que desejas, e não é todas as manhãs
que esta luz te abraça com o seu fulgor
de ave, convidando-te a partir até ao fim
da terra. Não precisas de levar contigo
mais do que o sorriso que se abriu
no instante em que o sol nasceu; e
poderás enchê-lo com as palavras que
tantas vezes esboçaste, sem as dizer,
e agora fazem parte dos teus lábios
como a flor, que pertencia ao caule de onde
a cortei, para a deixar na mesa
que ficará vazia.

Nuno Júdice

sábado, 29 de maio de 2010


“Dor não tem nada a ver com amargura.
Acho que tudo que acontece
é feito pra gente aprender cada vez mais,
é pra ensinar a gente a viver. Desdobrável.
Cada dia mais rica de humanidade”

Adélia Prado

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Indecisão - Mara Senna

Indecisão

A lua continua nua e linda,
e eu cada vez mais vestida
de ainda.
Lua de pedra,
que imagem a tua!
Poucos sabem,
mas tu és muito mais que lua..

Mara Senna
in Luas Novas e Antigas

terça-feira, 25 de maio de 2010

Ninho - Mara Senna

Ninho

Outro dia descobri, por acaso,
na minha roseira, um simpático ninho.
Que passarinho teria escolhido
essa locação de perfume com espinho?
Um passarinho muito sábio
que, parece, encontrou a medida.
Não é essa a combinação da própria vida?

Mara Senna
in Luas Novas e Antigas



segunda-feira, 24 de maio de 2010


"O que está suposto na arte é amor divino, por isso é que é incansável, eterna, perene alegria. Artista nenhum gera a sua própria luz, disto, sei, e quem mo contou não foi o sangue nem a carne, mas o Santo Espírito do Senhor."

(Adélia Prado, Cacos para um vitral: 123)

domingo, 23 de maio de 2010

"Angústia é um nó muito apertado bem no meio do sossego.”

Adriana Falcão

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Meu Deus, me dê a Coragem - Clarice Lispector



Meu Deus, me dê a coragem
de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites,
todos vazios de Tua presença.
Me dê a coragem de considerar esse vazio
como uma plenitude.
Faça com que eu seja a Tua amante humilde,
entrelaçada a Ti em êxtase.
Faça com que eu possa falar
com este vazio tremendo
e receber como resposta
o amor materno que nutre e embala.
Faça com que eu tenha a coragem de Te amar,
sem odiar as Tuas ofensas à minha alma e ao meu corpo.
Faça com que a solidão não me destrua.
Faça com que minha solidão me sirva de companhia.
Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar.
Faça com que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir
como se estivesse plena de tudo.
Receba em teus braços
o meu pecado de pensar.

Clarice Lispector

terça-feira, 18 de maio de 2010

Reflexão nº 1 - Murilo Mendes

Foto: Carmen Fanganiello

Reflexão nº 1

Ninguém sonha duas vezes o mesmo sonho
Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio
Nem ama duas vezes a mesma mulher.
Deus de onde tudo deriva
E a circulação e o movimento infinito.
Ainda não estamos habituados com o mundo
Nascer é muito comprido.

Murilo Mendes

sábado, 15 de maio de 2010

Saudade - Mara Senna

Saudade

A saudade mora
nestas caixas de guardados,
cheirando a naftalina,
entulhadas de vestidos
de noiva e de formatura
que não servem mais na cintura.
Alimenta-se de restos, de vestígios
e de flores de sepultura.
Nunca é feliz: chora nos aniversários,
no Natal e no Ano Novo.
Vive fazendo perguntas sem respostas,
anda longas distâncias à procura de nada
e faz viagens imaginárias sem rumo algum.
A dor da saudade dói,
aguda ou crônica,
intermitente ou pulsante,
subliminar, quase anestesiada.
Mas dói.

Mara Senna
(do livro Luas Novas e Antigas)

sexta-feira, 14 de maio de 2010

As ensinanças da dúvida - Thiago de Mello

As ensinanças da dúvida

Tive um chão (mas já faz tempo)
todo feito de certezas
tão duras como lajedos.

Agora (o tempo é que o fez)
tenho um caminho de barro
umedecido de dúvidas.

Mas nele (devagar vou)
me cresce funda a certeza
de que vale a pena o amor.

Thiago de Mello

Mais sobre Thiago de Mello em http://pt.wikipedia.org/wiki/Thiago_de_Mello

quinta-feira, 13 de maio de 2010

A História de Nós Dois


Uma comédia romântica e inteligente


Assisti a essa peça no último fim de semana no Teatro Vanucci no Rio e gostei muito. 
É a história do casal Lena e Carlos e de como seu casamento se dissolve, perdido no meio das armadilhas da rotina e cumpre bem a exata missão descrita na capa do programa: ser uma comédia romântica.
A história de Lena e Edu, ou melhor: Mammy e Duca, ou...quem sabe, Carlos Eduardo e Maria Helena. Enfim, a história do casal protagonista transcorre na noite em que Edu - separado de Lena há algum tempo - vai buscar seus últimos pertences no apartamento. O derradeiro encontro vira um inevitável ajuste de contas cômico e emocionante. Afinal, de quem é a culpa? Essa é a pergunta chave.
Diretor da peça, Ernesto Piccolo, soube adequar com perfeição cada nuance do texto de Lícia Manzo ao espaço físico do pequeno palco. A proximidade com a platéia deixa o tom mais intimista e facilita a empatia. Para completar, a cenografia, assinada por Clívia Cohen, ajusta corretamente a ação dos atores, o roteiro e o espaço.
Alexandra Richter e Marcelo Valle seguram todos os momentos com simetria exata e uma química que convence quem assiste. Juntos interpretam os seis personagens  que exemplificam cada fase do casal.
Para não perder o foco e dar mais dinamismo ao espetáculo, o uso de vídeos exibidos no telão coloca o espectador dentro do histórico do casal e permite que os atores trabalhem mais centrados e ao mesmo tempo com mais liberdade. O recurso audiovisual, comandado por Miguel Pachá, convence.
A direção apurada e cuidadosa de Piccolo, valorizada pela sintonia entre os atores, dá um tempero com sabor de descontração e graciosidade ao espetáculo. A trilha sonora, do DJ Rodrigo Penna é um show à parte.
O diferencial da peça é exatamente o uso de todos os clichês de comédias românticas, mas com total atenção aos detalhes e ao timing da comédia. A peça é risada do início ao fim, com humor inteligente e ágil. Está bem longe de ser um pastelão. Sem contar que não tem como sair do teatro sem pensar: já vi esta história antes. Conclui-se que a vida também é um grande (e delicioso) clichê."

Fonte: Jaqueline Porto - Almanaque Virtual

terça-feira, 11 de maio de 2010

Poema da amante - Adalgisa Nery


Adalgisa Nery em retrato feito por seu primeiro marido, o pintor Ismael Nery

Poema da amante

Eu te amo
Antes e depois de todos os acontecimentos,
Na profunda imensidade do vazio
E a cada lágrima dos meus pensamentos.
Eu te amo
Em todos os ventos que cantam,
Em todas as sombras que choram,
Na extensão infinita dos tempos
Até a região onde os silêncios moram.

Eu te amo
Em todas as transformações da vida,
Em todos os caminhos do medo,
Na angústia da vontade perdida
E na dor que se veste em segredo.
Eu te amo
Em tudo que estás presente,
No olhar dos astros que te alcançam
E em tudo que ainda estás ausente.

Eu te amo
Desde a criação das águas,
desde a ideia do fogo
E antes do primeiro riso e da primeira mágoa.
Eu te amo perdidamente
Desde a grande nebulosa
Até depois que o universo cair sobre mim
Suavemente.

Adalgisa Nery

(1905-1980)

Mais sobre Adalgisa Nery em http://pt.wikipedia.org/wiki/Adalgisa_Nery

Serão Literário - Nelson de Oliveira

Com atraso, mas ainda em tempo, quero comentar sobre o serão literário do mês de abril, que contou com a presença do escritor Nelson de Oliveira. É um escritor dotado de uma fina ironia e muito senso de humor. Segundo Chico Lopes, "inquietar, incomodar, cavar no veio do imprevisto, tarefa essencial do criador contemporâneo, é coisa inata em Nelson. Com uma obra multifacetada, que percorre o conto, o ensaio, o romance, é um escritor para nosso tempo."

Nascido em Guaíra, SP, em 1966, possui o título de doutor em Letras pela Universidade de São Paulo (USP), e publicou, dentre outros títulos, Naquela época tínhamos um gato (1998), Treze (1999), Subsolo infinito (2000), O filho do crucificado (2001) e A maldição do macho (2002). Organizou duas antologias de contos da geração 90: Manuscritos de computador (2001) e Os transgressores (2003).  Outras obras mais recentes: Cenas da favela, 2007; Babel Babilônia, 2007; Ódio sustenido, 2007; A oficina do escritor: sobre ler, escrever e publicar, 2008; Axis Mundi: O jogo de Força na Lírica Portuguesa Contemporânea, 2009;
Tem textos (contos e críticas) publicados nas revistas Cult e Livro Aberto (SP), Medusa (PR) e Bravo, e nos jornais Correio Braziliense, O Globo e Suplemento Literário de Minas Gerais, Jornal Literário Rascunho e Folha de São Paulo.
Recebeu diversos prêmios, entre eles o Casa de las Americas (1995), Fundação Cultural do Estado da Bahia (1996), Melhor Livro de Contos: O filho do Crucificado, Associação Paulista dos Críticos de Arte(2001), Melhor Projeto Editorial: Geração 90, os transgressores, Associação Paulista dos Críticos de Arte(2003), Prêmio Clarice Lispector, Fundação Biblioteca Nacional(2007).

segunda-feira, 10 de maio de 2010

domingo, 9 de maio de 2010

Mãe - Mário Quintana

Mãe

Mãe... São três letras apenas
As desse nome bendito:
Também o Céu tem três letras...
E nelas cabe o infinito.
Para louvar nossa mãe,
Todo o bem que se disse
Nunca há de ser tão grande
Como o bem que ela nos quer...
Palavra tão pequenina,
Bem sabem os lábios meus
Que és do tamanho do Céu
E apenas menor que Deus!

Mário Quintana

sexta-feira, 7 de maio de 2010


"Eu preparo uma canção
em que minha mãe se reconheça,
Todas as mães se reconheçam,
e que fale como dois olhos."

Carlos Drummond de Andrade

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Soneto de Aniversário - Vinicius de Moraes

foto: Carmen Fanganiello

Soneto de aniversário

Passem-se dias, horas, meses, anos
Amadureçam as ilusões da vida
Prossiga ela sempre dividida
Entre compensações e desenganos.

Faça-se a carne mais envilecida
Diminuam os bens, cresçam os danos
Vença o ideal de andar caminhos planos
Melhor que levar tudo de vencida.

Queira-se antes ventura que aventura
À medida que a têmpora embranquece
E fica tenra a fibra que era dura.

E eu te direi: amiga minha, esquece...
Que grande é este amor meu de criatura
Que vê envelhecer e não envelhece.

Vinicius de Moraes

quarta-feira, 5 de maio de 2010

10a. Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto

Vejam quanta gente boa estará presente na 10a. Edição da Feira do Livro de Ribeirão Preto que acontece de 10 a 20 de junho de 2010. Já confirmaram presença os autores:
Adriana Lisboa, Alessander Guerra, Ana Paula Maia, Augusto Cury, Carlos Heitor Cony, Carola Saavedra, Celso Antunes, Claúdia Tajes, Clovis Bulcão, Cristina Silveira, Cristovão Tezza, Daniel Galera, Daniel Pelizari, Fabrício Carpinejar, Fabrício Corsaletti, Gabriel Chalita, Guilherme Davoli, Heloisa Bacelar,I gnácio de Loyloa Brandão, João Silverio Trevisan, Laurentino Gomes, Lola Aybar, Luis Tatit, Marcia Bulcão, Márcia Tiburi, Maria Gessy de Sales, Marina Colassanti, Mário Prata, Mário Sergio Cortela, Moacyr Scliar, Mouzar Benedito, Nelson Schapochnik, Nicole Algranti, Palmério Doria, Pasquale Cipro Neto, Paulo Markum, Pedro Bandeira, Rainhas do Lar com Katita e Faby,Raphael Coutinho, Ricardo Daunt, Ricardo Kotscho, Rubem Alves, Saulo Gomes, Sócrates, Tatiana Levy, Thalita Rebouças, Toni Belotto, Wilson Bueno, Xico Sá e Zuenir Ventura.

Compensação - Cecília Meireles


Hoje eu quereria estar no deserto amarelo, sem beduíno, camelo ou rebanho de cabras: no puro deserto amarelo onde só reina o vento grandioso que leva tudo, que não precisa nem de água, nem de areia, nem de flor, nem de pedra, nem de gente.
O vento solitário que vai para longe de mãos vazias.
Hoje eu quereria ser esse vento!

 Trecho de Compensação de
Cecília Meireles.

domingo, 2 de maio de 2010

Flor de maio - Mara Senna


Flor de maio

De onde surgiu essa flor
de beleza tão inusitada?
- ‘Brotou desse ramo rústico’,
respondeu-me alguém da sacada.
Mas, então, a minha esperança
também pode brotar do sofrimento árido...
De repente, notei, já era maio,
meu mês de nascer,
não de chorar.
Meu tempo de flor.
Essa flor do improvável.

Mara Senna
(este poema faz parte do livro Luas Novas e Antigas)


sábado, 1 de maio de 2010